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domingo, 16 de fevereiro de 2014

O chão da casa de Trotski era vermelho


Sugerido por Tamára Baranov
Por Cynara Menezes | Socialista Morena | Carta Capital
(Jardim do Museu Casa de Leon Trotski em Coyoacan)
“Stalin matou nossa velha revolução vermelha para sempre”, escreveu Allen Ginsberg em seu poema Capitol Air. As palavras do poeta beat ressoavam em minha cabeça enquanto eu percorria o Museu Casa de Leon Trotski, em Coyoacan, na Cidade do México. Acho que é um dos museus mais tristes do mundo. Estão depositadas naquele jardim as cinzas do revolucionário russo, assim como as de sua companheira Natália Sedova. É como se o lugar fosse a tumba do sonho comunista. Como se tivesse uma placa invisível pairando sobre a cabeça do visitante: “aqui jaz o comunismo”.
O escritor cubano Leonardo Padura, autor do romance O Homem Que Amava os Cachorros, sobre a vida (e a morte) de Leon Trotski, já havia me contado da emoção que sentira ao entrar naquela casa, muitos anos antes de pensar em escrever o livro. Ali, em agosto de 1940, o catalão Ramón Mercader desferiu o golpe de picareta na cabeça que mataria o segundo do triunvirato que comandou a Revolução Russa em 1917. Lenin estava morto desde 1924. Agora, só sobraria Josef Stalin, a quem Trotski apelidara “o coveiro da revolução”.
No museu ficamos sabendo que Stalin não só perseguiu Trotski até o México como dizimou quase toda a sua descendência: só sobraram dois netos. A tristeza que paira sobre a casa é ainda maior porque normalmente quem a visita o faz depois de ir à Casa Azul, o museu de Frida Kahlo, a poucas quadras dali. A casa de Frida, onde Trotski morou um tempo quando chegou ao México, é colorida, alegre, cheia de vida. A casa de Trotski é escura, acinzentada, com muros altos, protegida por guaritas de vigilância.
Também é um museu acanhado para a estatura de Leon Trotski, como personagem histórico e intelectual. As fotos parecem xerocadas, tudo dá a impressão de ser meio improvisado. Mas as imagens mostram um homem bastante sorridente, relaxado, em paz. Trotski aparenta estar feliz em terras mexicanas. Sente-se livre, talvez? Faz excursões com seus jovens aprendizes, recolhe cactos na natureza para plantar no jardim. Bonito jardim.
A casa onde Leon e Natália viveram permanece intacta. O tempo lá dentro está em suspensão. O chão da casa de Trotski é vermelho, sobre a cama dele há um chapéu e uma bengala. No armário, seu pijamas favorito, algumas roupas e os sapatos de Natália. Que pezinhos pequeninos. No escritório de Trotski, um caderno de anotações aberto. A porta de saída é mínima e blindada. As janelas são tapadas até a metade.
Sinto o peso do mundo sobre meus ombros, penso sobre a capacidade humana de estragar ideias extraordinárias, a possibilidade de um mundo novo, por causa da inveja, do desejo de poder, da vaidade. Na saída, no jardim da casa de Leon Trotski, encontro um beija-flor morto sobre um copo-de-leite.

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