“Independentemente da tipificação jurídica, sempre o julgamento é político”, disse especialista em direito eleitoral, explicando que impeachment depende do Congresso
Jornal GGN - “O julgamento de impeachment é antes político do que jurídico”, disse o presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP, Alberto Rollo, ao GGN. O especialista em direito eleitoral, que se encontrou com Ives Gandra, o advogado autor do parecer contra a presidente Dilma Rousseff, disse que o professor deixou claro e também lhe confirmou: “independentemente da tipificação jurídica, sempre o julgamento é político”.
A abertura da entrevista escancarou que muito se fala sobre o delicado tema, mas pouco se sabe. Não depende exclusivamente de argumentos, nem da atuação de um presidente da Câmara ou Senado. Mas um longo caminho, estabelecido por regras, com jurisprudência e herança pesada de um passado recente, além da jogatina política.
“[O impeachment] começa na Câmara e termina no Senado, como foi o do Collor. Lógico que os deputados e senadores têm o compromisso com a Constituição, com a verdade, com as provas, mas, no final das contas, o julgamento é político. Talvez, na consciência de cada um [parlamentar] vá pesar a seguinte dúvida: se eu votar para cassar a presidente Dilma, vai ser melhor ou vai ser pior para o Brasil? E eles têm o direito de pensar assim”, indicou Rollo.
A explicação não é opinativa, sustenta-se na Carta Magna.
Com a Constituição na mão, Alberto Rollo contou quais são as etapas de um processo de impeachment se a presidente da República fosse alvo, quem julgaria, quais são as condições para dar início e quais seriam as consequências.
Abrindo a Lei 1.079 de 1950, o especialista em direito eleitoral afirmou que crimes diferentes cometidos por um presidente da República podem ter regras próprias de julgamento. Quando se tratam de crimes comuns, por exemplo, o julgamento é feito pelo Supremo Tribunal Federal. Mas se são crimes de responsabilidades, é o Senado que julga.
E, primeiramente, a denúncia deve ser protocolada na Câmara dos Deputados. Nesse momento, o presidente da Casa, atualmente Eduardo Cunha (PMDB), não tem poder exclusivo de decisão, apenas pode tornar o processo mais rápido ou mais devagar. Lá, dois terços dos deputados têm que votar pela aprovação da denúncia.
Assim, se 342 deputados federais concordarem com o julgamento, a matéria é encaminhada para o Senado Federal, órgão capacitado a processar e julgar o impeachment. Nessa fase, o presidente da República fica suspenso temporariamente do cargo, e o vice-presidente, no caso atual Michel Temer (PMDB), assume.
A partir daí, o Senado fica encarregado de ouvir as testemunhas, colher provas, emprestando poderes até então apenas de responsabilidade do Judiciário. Com o intuito de tornar os trabalhos de apuração mais imparciais possíveis, é o presidente da Corte Máxima brasileira quem preside a sessão de julgamento. Ou seja, Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), dirigiria o processo.
“Por que colocaram o presidente do STF nesse ponto, nesse momento? Primeiro, porque estamos falando de presidente da República, então, olhe só a instabilidade de 200 milhões de brasileiros. [A decisão é para garantir] o mínimo de lisura, o mínimo de cuidado, cautela, e não transformar esse processo e sessões em um espetáculo de um colocando o dedo na cara de outro. Agora, o presidente do STF não vota, só dirige os trabalhos”, explicou o integrante da OAB-SP.
As características do julgamento são semelhantes a uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Os senadores passam a ter poder de investigação, de quebras de sigilos, acesso a inquéritos e documentos em segredo de Estado, intimar depoimentos, entre outras competências da Justiça. Nessa linha, e se ocorresse neste momento, o Senado também teria poder de requisitar todos os autos e apurações do Ministério Público Federal sobre a Operação Lava Jato, por exemplo.
Para deferir o impeachment, novamente seriam necessários dois terços dos votos dos senadores. Ou seja, para ser condenada, 54 membros da Casa deveriam julgar pelo impeachment da presidente da República.
Durante o processo de julgamento, desde o momento em que a Câmara aprova, há um prazo de 180 dias para o presidente permanecer afastado. Se transcorrerem esses seis meses, o presidente volta a assumir o cargo, ainda que o julgamento não seja concluído, devendo o mesmo continuar a tramitar.
Uma vez condenado, há dois tipos de penas. A principal, que é a perda do mandato e do cargo, e a acessória, que seria a inelegibilidade por oito anos. Não há definição na Constituição para a obrigatoriedade de aplicação da pena acessória. Por isso, é o Senado também que define se o presidente perde o mandato e fica inelegível, ou se apenas perde o cargo. Quem assume é o vice-presidente até o fim do mandato.
Caso o presidente da República renunciasse durante o processo, antes de ser julgado, ou tivesse a cassação do seu diploma, a mesma pena é aplicada, e o presidente da República perde o cargo, sendo o vice-presidente quem deve assumir.
Apenas em um dos casos, não é o vice que assume: quando a cassação é decorrente de processo eleitoral, por exemplo, com irregularidades no uso de recursos para a campanha. O último prazo para esse tipo de processo terminaria em até 15 dias após a diplomação da presidente da República.
Entretanto, o artigo 32 da lei 9.504 (Lei das Eleições), prevê que os candidatos devem conservar a documentação de prestações de contas da campanha por 180 dias, ou seja, seis meses, “estando pendente de julgamento qualquer processo judicial relativo às contas”. Se eventuais questionamentos foram suscitados em representação eleitoral, o prazo para cassação por processo eleitoral, portanto, é estendido para 180 após a diplomação.
Neste caso, Alberto Rollo explica que nos dois primeiros anos de mandato, novas eleições são chamadas em 90 dias, e nos dois últimos, é o vice-presidente quem assume. A mesma regra ocorre quando há a vacância do vice-presidente da República, por morte, renúncia, ou quando é condenado.
Independente do processo de julgamento, o presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP mostrou que os passos para um afastamento da gestão de Dilma Rousseff não são simples, exigem diversos fatores e dependem de um detalhado percurso no Congresso.
“A parte criminal do presidente da República, no capítulo de responsabilidade, tipifica como crime. Ser omisso também tem previsão, tanto na Constituição, quanto na lei 1079 de 1950. Mas existe uma diferença entre o julgamento jurídico e o julgamento político. E isso o professor Ives Gandra deixou claro na manifestação: juridicamente o processo tem sentido, mas depende do Congresso, e lá o julgamento é político”, concluiu Alberto Rollo.
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