Autor: Diogo Costa, no GGN
ATIPICIDADES DO ATUAL CENÁRIO ELEITORAL BRASILEIRO - Em sete dias chegará finalmente a hora da verdade no pleito de 2014. Não se pode compreender o cenário desta eleição sem voltar um pouco no tempo para entender as circunstâncias que nos levaram até aqui.
O ano de 2012 marcou o pontapé inicial na estratégia da oposição tradicional ('grande mídia', PSDB, DEM e PPS). Em maio deste ano o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, inventou uma estória a respeito de um encontro que teve com Lula no escritório particular do ex Ministro Nelson Jobim.
Disse o ministro nomeado por FHC que Lula havia sugerido que o julgamento da AP 470 não deveria ser feito de forma simultânea com o processo eleitoral municipal de 2012 (o que em si não teria nada de mais). A "denúncia" premeditada com fins escusos e eminentemente político-partidários foi prontamente rechaçada por Lula e Nelson Jobim.
No entanto o aparato oligopólico de mídia conseguiu o seu intento a partir deste factoide. Ou seja, conseguiu que o então presidente do STF, Carlos Ayres Britto, finalmente marcasse a data do julgamento para o dia 02 de agosto, no meio do processo eleitoral, como queriam os inimigos de Lula e do PT.
A partir de 02 de agosto, e durante intermináveis 04 meses e meio (até o dia 17 de dezembro de 2012), teria lugar no Brasil um abominável e inédito processo de linchamento pirotécnico contra os réus da referida ação. O linchamento teve como alvo preferencial, como não poderia deixar de ser, as grandes e históricas figuras públicas do Partido dos Trabalhadores.
Do ponto de vista jurídico-político esse julgamento caiu como uma bomba na cabeça dos réus petistas. Mas do ponto de vista partidário as movimentações políticas visando 2014 começaram antes até deste referido julgamento.
O governador de Pernambuco na época, Eduardo Campos, começaria no pleito de 2012 a sua estratégia de montar uma "terceira via" política. Para tanto ele se movimentou e conduziu o PSB para um afastamento do PT em algumas cidades importantes, onde havia uma histórica aliança entre estes partidos.
O caso mais notório dessa estratégia de distanciamento do PSB em relação ao PT foi o da disputa da cidade do Recife, que há 12 anos estava sob controle do PT. No mês de junho de 2012, quando Eduardo Campos rompeu com o PT pernambucano e lançou Geraldo Júlio para a prefeitura teve início a ruptura maior que o tempo haveria de confirmar.
Da mesma forma que se afastou do PT, Eduardo Campos costurou e amplificou as alianças diversas com o PSDB nas eleições municipais de 2012 (o PSB e o PSDB tinham alianças municipais e estaduais anteriores ao pleito deste ano, inclusive). O caso mais importante onde essa estratégia foi aplicada aconteceu em Belo Horizonte onde o prefeito Márcio Lacerda, em busca da reeleição, derrotou por estreita margem o candidato petista, Patrus Ananias.
Em dezembro de 2012 FHC lançou Aécio Neves para a presidência da república. Eduardo Campos negaria essa pretensão até outubro de 2013.
Durante todo o ano de 2013 a oposição tratou de buscar uma ruptura do PSB com o bloco de apoio ao governo, além de incentivar a candidatura presidencial de Eduardo Campos. Ao fim e ao cabo conseguiram. Mas a estratégia da oposição nunca foi somente esta. Sempre souberam eles que seria muito importante lançar o maior número de candidaturas possíveis contra a reeleição de Dilma Rousseff. Trabalhariam com afinco neste sentido até junho de 2014.
Dentro dessa estratégia de lançar inúmeras candidaturas contra o PT, a 'grande mídia' tratou de endeusar Joaquim Barbosa e de tratá-lo como um dos postulantes ao Palácio do Planalto até o dia 05 de abril de 2014 (prazo final para a desincompatibilização e filiação de magistrados).
Outra ponta dessa estratégia era garantir a candidatura de Marina Silva, que em fevereiro de 2013 começou a coleta de assinaturas para criar um partido que poderia finalmente chamar de seu, no caso, a Rede Sustentabilidade. Essa estratégia foi anulada por incompetência pura e simples de Marina e de seus aliados que em 08 meses não conseguiram juntar sequer as 490.000 assinaturas necessárias para oficializar a novel legenda.
Para não ver naufragar completamente a tese das múltiplas e viáveis candidaturas oposicionistas, ainda conseguiram convencer Eduardo Campos e Marina Silva a assumir um casamento de fachada na data limite para tanto (05 de outubro de 2013).
Marina filiou-se no PSB e essa decisão, tomada há quase 01 ano, é que está salvando a oposição de sofrer a sua maior derrota em todos os tempos para o PT.
No meio de tudo isto ainda houve a questão do junho de 2013. As manifestações começaram logo após a virulenta repressão da PM de São Paulo, comandada há 20 anos ininterruptos pelo PSDB, contra um protesto do MPL em 06 de junho. A revolta foi crescendo e se alastrou por quase todo o Brasil até chegar ao seu ápice no dia 20 de junho.
Não se trata agora de analisar de forma aprofundada este fenômeno, mas sim de compreender que a brutal instrumentalização midiática que foi feita a partir dele atingiu em cheio, tal e qual a AP 470, o Partido dos Trabalhadores. Note-se que a AP 470 sequer arranhou a popularidade de Dilma Rousseff, em compensação as manifestações de junho de 2013 derrubaram momentânea, abrupta e fortemente o apoio popular ao seu governo.
Chegamos enfim ao ano de 2014 e em abril se dissipou toda e qualquer ideia de candidatura de Joaquim Barbosa. O cenário eleitoral se delineou com apenas 03 candidaturas viáveis eleitoralmente (Eduardo Campos, Aécio Neves e Dilma Rousseff). Bom para o governo federal e ruim para a oposição.
Passada a breve digressão, passemos ao cenário eleitoral em si.
As duas últimas pesquisas feitas pelo Datafolha antes da morte de Eduardo Campos mostraram Dilma Rousseff rigorosamente no mesmo patamar, com 50% dos votos válidos. A eleição de 2014, para surpresa dos que pouco entendem de política, se encaminhava para uma reeleição tranquila de Dilma.
E então veio a tragédia que provocou uma comoção nacional. No dia 13 de agosto de 2014 o candidato presidencial do PSB, Eduardo Campos, morreu num acidente de avião na cidade de Santos, no Estado de São Paulo.
Uma eleição que até então, diga-se de passagem, estava absoluta e rigorosamente favorável para a manutenção de Dilma Rousseff no Palácio do Planalto, como atestavam as duas pesquisas feitas pelo Datafolha desde o início da campanha em 05 de julho.
O que parecia ser uma volta olímpica da situação de uma hora para outra se tornou uma dura e renhida batalha.
Marina Silva ressurgiu das cinzas da insignificância e da incompetência (sequer conseguiu fundar o seu próprio partido) para virar do avesso as expectativas eleitorais. Ela se beneficiou duplamente do novo cenário político.
Em primeiro lugar a comoção causada pela morte de Eduardo Campos a catapultou de forma fulminante na disputa. E em segundo lugar Marina Silva deixou de ser alvo da oposição e da situação desde outubro de 2013, quando se viu que ela não seria candidata. Ficou, portanto, de outubro de 2013 até 13 de agosto de 2014 pairando acima das contendas políticas enquanto Dilma, Aécio e Eduardo Campos estavam se engalfinhando no ringue há muito e muito tempo.
Marina entrou lépida e fagueira no meio da campanha, beneficiada pela preservação política de quem havia submergido e beneficiada pela comoção de uma tragédia. Fosse Marina Silva a candidata do PSB desde o início e a sua aura já teria sido quebrada (como vem sendo agora). Como não era, se preservou e conseguiu subir de forma meteórica.
Passada a tragédia o que vimos foi o Datafolha colocar Dilma Rousseff e Marina Silva empatadas na intenção de votos (39% dos votos válidos) quando se contavam apenas 16 dias da morte de Eduardo Campos (no segundo turno a vantagem de Marina foi marcada em 10 pontos percentuais para cima de Dilma).
A partir deste ápice "marinístico", ocorrido no dia 29 de agosto de 2014, todos os levantamentos do Datafolha mostraram a queda gradual e constante de Marina e a subida também gradual e constante de Dilma tanto no primeiro quanto no hipotético segundo turno da disputa. Chegamos nesta toada até o cenário atual, de franca recuperação de Dilma e de queda da moça lá do Acre.
O Datafolha nos diz que Dilma tem hoje 45% dos votos válidos. Não é de forma alguma um patamar surpreendente visto que nas duas pesquisas anteriores ao falecimento de Eduardo Campos a presidenta ostentava a excelente marca de 50% dos votos válidos.
A verdade é que se a tragédia que abateu Eduardo Campos tivesse ocorrido um mês antes, lá por meados de julho, Marina Silva não teria a mínima condição de romper com a polarização PT x PSDB. O pouco tempo em que ela figurou como candidata presidencial foi um ponto a seu favor pois impediu que o transcorrer normal do debate a fizesse derreter a tempo de ser superada por Aécio Neves.
Como o que importa são os fatos, não há que se tergiversar. Marina Silva foi beneficiada pela comoção de uma tragédia? Sim. Foi beneficiada por ter entrado totalmente preservada e livre de críticas no meio e não no início da campanha? Sim. Mas isso agora pouco importa. Foi o que aconteceu e é em cima disto que se deve trabalhar.
É inegável que Dilma Rousseff se recupera fortemente, que a candidatura de Marina está em queda e que Aécio Neves está subindo ligeiramente. O que acontece é que não há mais um mês de campanha, mas sim apenas uma semana. Penso que as curvas de intenções de votos dos candidatos não irão se modificar e defendo a tese de que há uma grande possibilidade de haver um segundo turno.
Este hipotético segundo turno seria entre Dilma Rousseff e Marina Silva, alijando o PSDB da polarização que durou 20 anos. E penso desta forma apenas porque temos só uma semana até a votação. Se tivéssemos duas semanas a grande possibilidade seria a de vitória de Dilma Rousseff já no primeiro turno e a de aproximação ainda maior entre Marina e Aécio.
Dilma entrará no segundo turno com muita força, numa crescente política. Marina, ao contrário, entrará no segundo turno em linha descendente. Isto faz muita diferença em qualquer disputa.
Além disso, e apesar do senso comum que diz que "segundo turno é outra eleição", a experiência histórica nos mostra que jamais houve uma virada em eleições presidenciais no Brasil.
Mesmo no campo das eleições estaduais as viradas não são uma constante. Tivemos até hoje 79 segundos turnos em disputas estaduais e apenas 22 viradas. Entre estas 22 viradas estaduais, apenas 04 ocorreram quando a diferença do primeiro para o segundo colocado no primeiro turno foi superior aos 10% de votos válidos. Em apenas uma oportunidade (entre as 22) houve uma virada quando a diferença do primeiro para o segundo colocado no primeiro turno da disputa estadual foi superior a 13% dos votos válidos.
Ou seja, mesmo as viradas estaduais são uma minoria. E são uma ínfima minoria quando a diferença entre os postulantes é superior aos 10% de votos válidos. A única virada que houve quando a diferença entre os postulantes ficou acima de 13% dos votos válidos demonstra bem o caráter excepcional deste acontecimento.
A grande batalha deste pleito de 2014, o grande cabo de guerra entre situação e oposição foi disputado em torno dos percentuais de votos válidos de Dilma no primeiro turno. Era e é de fundamental importância para a oposição conseguir fazer com que Dilma tenha um baixo percentual de votos no primeiro turno. Essa batalha Dilma já venceu.
Nas campanhas vitoriosas do PT em 2002, 2006 e 2010, os votos válidos conquistados pela legenda nos respectivos primeiros turnos ficaram entre 46 e 48%. Tudo indica que Dilma vai ficar exatamente nessa média no pleito atual e isto representa uma doída derrota na estratégia oposicionista de desgaste permanente de Dilma e do PT.
Essa estratégia simplesmente não deu certo e o hipotético segundo turno, como já vimos, não deverá trazer grandes surpresas mas sim confirmar a reeleição de Dilma Rousseff.
Sem querer dar uma de adivinho, mas tentando ser isento e analisar as oscilações dos postulantes, termino colocando os percentuais que imagino que veremos na apuração de 05 de outubro.
Desde 10 de setembro e também em 24 de setembro defendi que estes percentuais de votos válidos acabariam sendo o retrato aproximado do primeiro turno de 2014. Faltando apenas sete dias para o pleito, mantenho a avaliação:
-Dilma Rousseff: 47%;
-Marina: 28%;
-Aécio Neves: 22%;
-Outros: 03%.