Se alguma coisa a campanha eleitoral propiciou, foi clarificar os verdadeiros interesses em conflito no país. A ficção de uma terceira via voltou para o ralo. Tanto nas declarações como nas proposições e na base social que as apoiam, as candidaturas de Marina Silva e Aécio Neves têm se aproximado de maneira indiscutível.
O confronto em jogo está evidente. Os dois candidatos oposicionistas afirmam em alto e bom som que o objetivo é tirar o PT do poder. As articulações de bastidores com vistas a um eventual segundo turno acontecem a céu aberto. O ex-presidente FHC resumiu o sentimento num jantar com milionários pró-Aécio: "Apelo mesmo". Um bordão de amplo espectro.
A esta altura, Aécio Neves, de candidato competitivo, viu-se reduzido a moeda de troca. Cardeais tucanos negociam sem constrangimento o voto em Marina para "impedir o mal maior". A ironia é que isso acontece justo no momento em que algumas pesquisas injetaram sobrevida ao ex-governador de Minas.
Já a "entourage" de Marina escancara as opções da ex-ambientalista. Quer porque quer credenciar-se como candidata do grande capital. Corre atrás da alta sociedade seja onde for, como um trator à procura de uma árvore para derrubar. Fala em "atualizar" as leis do trabalho. Para bom entendedor, tais palavras bastam. Seus comícios populares se esvaziam na mesma proporção em que proliferam encontros com madames, empresários graúdos e financistas internacionais.
Claro, faz parte manter uma embalagem social. Para tentar preservar alguma popularidade entre os pobres, Marina recorre à sua origem humilde e sofrida -algo inquestionável. Problema: do outro lado estão um ex-metalúrgico que também passou fome e chegou à Presidência e uma militante torturada por defender a liberdade nos anos da ditadura. Ou seja, na comparação, até aí morreu Neves, com o perdão da coincidência.
O maior risco para o PT é calçar o salto alto e passar a viver de louros passados. Verdade seja dita: com ou sem barbeiragens do IBGE, os indicadores sociais, inclusive os anunciados pela ONU, mostram que o país mudou para melhor. Isto é fato. Mas o modelo de agradar gregos e troianos exibe sinais de esgotamento.
A campanha pela Constituinte exclusiva para uma reforma política até agora foi relegada a nota de rodapé em alguns discursos petistas. Medidas como a taxação das grandes fortunas dormitam nos escaninhos da legenda. A submissão às tergiversações do comandante do Exército em relação às torturas é indigna da tradição de um partido que se pretende popular.
Nestas duas semanas que precedem o primeiro turno, é possível prever chumbo grosso pela frente. Dossiês anônimos, vazamentos seletivos, fotos de maços de dinheiro, notas de agências de risco, especulação financeira, ataques pessoais -tudo será amplificado numa eleição tão disputada. Para separar o joio do trigo, não há outro caminho: mostrar o que se fez mas também dizer o que se fará.
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